terça-feira, julho 05, 2005

Para os "Ventos" que eu conheço...


A Manhã vem chegando devagar, sonolenta: três quartos de hora de atraso,
funcionária relapsa. Demora-se entre as nuvens, preguiçosa (...) Obrigada a
acordar cedíssimo para apagar as estrelas que a Noite acende com medo do escuro.
A Noite é uma apavorada, tem horror às trevas.
Com um beijo a Manhã apaga cada estrela enquanto prossegue a caminhada em
direcção ao horizonte.(...) Depois a manhã esquenta o Sol, trabalho cansativo,
tarefa para gigantes e não para tão delicada rapariga. (...) Sozinha, a Manhã
levaria horas para iluminar o Sol, mas quase sempre o Vento, soprador de fama,
vem ajudá-la.(...)
A respeito do Vento circulam rumores, murmuram-se suspeitas, dizem-no
velhaco e atrevido, capadócio a quem é perigoso dar ousadia. Citam-se as
brincadeiras habituais do irresponsável: apagar lanternas, lamparinas,
candeeiros, fifós para assombrar a Noite; despir as árvores dos belos vestidos
de folhagens, deixando-as nuinhas. Pilhérias de evidente mau hosto; no entanto,
por incrível que pareça, a Noite suspira oa vê-lo e as árvores do bosque
rebolam-se contentes à sua passagem, umas desavergonhadas.
(...)
Um tanto quanto louco, decerto; não vamos esconder os defeitos do Vento.
Mas por que não falar também das suas inegáveis qualidades? Alegre, ágil,
dançarino de fama, pé-de-valsa celebrado, amigueiro, sempre bem disposto a
ajudar os demais, sobretudo em se tratando de senhoras e donzelas.
(...)
Bisbilhoteiro e audacioso, rei dos andarilhos, rompendo fronteiras,
invadindo espaços, vasculhando esconderijos, o Vento carrega um alforje de
histórias para quem queira ouvir e aprender (...)

In "O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá- uma história de amor", de Jorge Amado

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